PISO NACIONAL DO MAGISTÉRIO: HERÓI OU VILÃO?
Por José Daniel Raupp Martins

PISO NACIONAL DO MAGISTÉRIO: HERÓI OU VILÃO?
Advogado na AJS ADVOGADOS ASSOCIADOS, ex-Prefeito Municipal e assessor de Sindicatos de Servidores Públicos.
Uma reflexão ao debate. Levante a mão quem for contra aumento de salário para professores, em especial os da educação básica (nível fundamental e médio). Aposto que ninguém levantará. Como advogado integrante da equipe da AJS ADVOGADOS ASSOCIADOS sempre militei nas trincheiras sindicais na luta pela implementação do piso nacional salarial do magistério entre tantas outras pautas que dizem respeito à luta dos trabalhadores públicos e privados por seus direitos.
Como vice-prefeito e prefeito de São Lourenço do Sul (2005 – 2016), encargos que tive a honra de exercer, como agente político vivenciei a experiência de lutar pela conquista de direitos aos servidores públicos, no caso magistério municipal quando atuava como assessor jurídico do SIMUSSUL – Sindicato dos Municipários de São Lourenço do Sul, e passado algum na condição de Gestor Público com atribuições de executar o sempre escasso orçamento público frente as demandas da sociedade, entre as quais, de suma importância atender as expectativas dos servidores públicos municipais.
No meio do caminho emerge a Lei Federal nº 11.738 de 16/07/2008, que institui o Piso Salarial Nacional dos Profissionais do Magistério Público da Educação Básica. Na época como vice-prefeito, que auxiliava o Prefeito no árduo mister de em meio ao equilíbrio da receita e despesa frente às inúmeras demandas da sociedade, ter que “da noite para o dia” implementar os valores do Piso Nacional do Magistério fixado pelo Governo Federal impactando de imediato nas contas públicas.
Haveriam os recursos advindos do FUNDEB (Lei nº 11.494, de 20/06/2007), hoje Lei nº 14.276, de 27/12/2021 que alterou a Lei nº 14.113/2020, Regulamento Fundeb, calculando na distribuição dos recursos federais com base na variação anual do custo aluno ano, porém nunca suficientes a realidade dos Municípios a concretização do Plano Nacional Educação.
Fato é, que já no ano seguinte a implantação do Piso Nacional do Magistério as sucessivas portarias do governo federal fixaram percentuais de reajuste do piso nacional em percentuais seguindo metodologia, fixados a partir do mesmo percentual de crescimento do valor anual mínimo por aluno referente aos anos iniciais do ensino fundamental, sendo devido anualmente a partir, inclusive, do mês de janeiro de cada ano, no caso iniciando em janeiro/2009. (art. 5º, § único da Lei nº 11.738/2008).
Assim de imediato no primeiro ano (2009) o piso foi fixado em R$ 950,00 para carga horária de 40 horas. Assim sucessivamente:
2010 – R$ 1.024,67 (7,86%)
2011 – R$ 1.187,97 (15,94%)
2012 – R$ 1.450,54 (22,2%)
2013 – R$ 1.567,00 (7,97%)
2014 – R$ 1.697,78 (8,32%)
2015 – R$ 1.917,78 (13,01%)
2016 – R$ 2.135,64 (11,36%)
2017 – R$ 2.298,80 (7,64%)
2018 – R$ 2.455,35 (6,82%)
2019 – R$ 2.557,74 (4,17%)
2020 – R$ 2.886,15 (12,84%)
2021 – R$ 2.886,15 (0%)
2022 – R$ 3.845,63 (33,24%)
- Fato é que como Gestor Público o mês de janeiro de cada ano era aguardado com ansiedade e preocupação quanto ao anúncio pelo Governo Federal do percentual a ser aplicado ao Piso do Magistério, haja vista que impactava diretamente nas despesas de pessoal.
Veja que no período em que estive exerci a honrosa missão como vice-prefeito e prefeito do Município de São Lourenço do Sul, caso tomado como exemplo, de 2009 a 2016 houve uma variação percentual do piso nacional do magistério no percentual de 86,66%, sendo que entre 2011 e 2012 a variação percentual nestes dois anos foi de 38,14%.
O que pretendo dizer com isso? Em suma, que o piso nacional sempre foi um dilema para Prefeitos e Governadores que em muitas vezes ou quase sempre viam os recursos repassados pelo FUNDEB comprometidos integralmente com vencimento e vantagens dos membros do magistério sem sobra de recursos às outras necessidades da educação.
No entanto, nunca deixamos de pagar o piso nacional aos Professores Municipais, muito pelo contrário, aqui no Município de São Lourenço do Sul enquanto desempenhei o encargo como vice-prefeito e prefeito, foram elaborados dois Planos de Carreira do Magistério e fixado em Lei Municipal o índice nacional. Isto é, toda vez altera o percentual pelo Governo Federal altera automaticamente o Piso do Magistério por força da vinculação a Lei Municipal.
- O Piso Nacional foi questionado através de Ações Declaratórias de Inconstitucionalidades no Supremo Tribunal Federal - STF. Primeiro foi a ADI 4.167 (julgada a constitucionalidade de toda a Lei); Segunda, foi no RE. 936.790, resultou Tema 958, em 29/05/2020, sobre a constitucionalidade da chamada hora atividade. Por último, em 26/02/2021, foi julgada a ADI 4848, no sentido da constitucionalidade da norma federal que prevê a forma de atualização do Piso Nacional do Magistério.
- O objetivo dessa reflexão é contribuir com o debate que se instalou a nível nacional por Prefeitos e Governadores que embora utilizem um discurso de valorização da educação, dos professores e demais membros do magistério, relutam em pagar o percentual anunciado pela Portaria nº 67, de 04/02/2022, que homologou parecer do Ministério da Educação fixando o percentual de 33,24 % (percentual de crescimento do valor anual mínimo por aluno) em R$ 3.845,63.
Muitos Prefeitos e Secretários de Educação fazem discursos emocionados em favor da educação e membros do magistério como propulsora da libertação e transformação da realidade das pessoas e do País. No entanto, mesmo nada tendo reajustado referente ao valor do piso ano 2021 (índice 0%), e mesmo, embora a pandemia, o que aliás embora trágico acontecimento cujas causas e consequências todos sabemos, mas para as finanças públicas em especial às municipais ocasionou redução de despesas como: pessoal (vantagens), eventos, transporte e merenda escolar, entre outras tantas ações que deixaram de ser executadas por conta das medidas restritivas de convívio social para evitar contágio da COVID 19. Em contra partida, nesse mesmo período os municípios apresentaram crescimento extraordinário nas receitas públicas derivados, por exemplo, do aumento arrecadação sobre energia elétrica (estiagem) e combustíveis.
O que de fato deve ser questionado é qual a real prioridade de Prefeitos e Governadores se realmente acreditamos que somente pela educação se faz uma nação. Com o devido respeito aos atuais Prefeitos e Governadores, mas não pagar o percentual fixado conforme Lei Federal 11.738/2008, utilizando subterfúgios de legalidade para postergar pagamento do piso aos membros do magistério, após sucessivas apreciações pelo STF sobre o tema declarando a constitucionalidade de todos os dispositivos, é transformar o Piso Nacional do Magistério em Vilão o que antes era herói da salvação nacional.
Como bem assentado no trecho da ementa do acórdão da ADI 4848 STF:
“A previsão de mecanismos de atualização é uma consequência direta da existência do próprio piso. A edição de atos normativos pelo Ministério da Educação, nacionalmente aplicáveis, objetiva uniformizar a atualização do piso nacional do magistério em todos os níveis federativos e cumprir os objetivos previstos no art. 3º, III, da Constituição Federal. Ausência de violação aos princípios da separação de Poderes e Legalidade."
“Ausente violação do art. 37, XIII, da Constituição. A União, por meio da Lei 11.738/2008, prevê uma política pública essencial ao Estado Democrático de Direito, com previsão de parâmetros remuneratórios mínimos que valorizem o profissional do magistério na educação básica.”
“Pedido na Ação Direta de Inconstitucionalidade julgado improcedente, com a fixação da seguinte tese: “É constitucional a norma federal que prevê a forma de atualização do piso nacional do magistério da educação básica.”
- Não obstante, o que se percebe atualmente é que os recursos arrecadados foram investidos em terceirizações dos serviços públicos onerando ainda mais o gasto total com pessoal.
Se realmente acreditamos, como acredito, ser a Educação libertadora a transformação de uma País em Nação na qual as pessoas deixem de ser objeto para serem sujeitos que se tenha coerência nas ações ente discurso e prática. Do contrário, mera retórica e aprofundamento do passivo de precatórios a serem pagos decorrentes de Ações Judiciais à cobrança da legalidade do Piso Nacional do Magistério. Aprofundando ainda mais o passivo trabalhista, hipotecando o futuro do conjunto da sociedade.
Apenas uma contribuição à reflexão e ao debate.
José Daniel Raupp Martins
Advogado na AJS ADVOGADOS ASSOCIADOS.
Ex-Prefeito Municipal de São Lourenço do Sul
